Etarismo: por que uma mulher que se reinventa incomoda tanto

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Etarismo

Mulheres têm uma capacidade incrível de se reinventar. Você com certeza deve conhecer alguma que estava infeliz na profissão e resolveu mudar de área de atuação. Ou ainda, ficou em casa cuidando dos filhos e depois que cresceram, voltaram ao mercado de trabalho ou para os bancos das escolas e universidades. Essa característica de camaleoa ficou ainda mais evidente na pandemia, quando o número de empreendedoras aumentou 45% em 22 países. Os dados estão no relatório Global Gender Gap Report 2022, do Fórum Econômico Mundial.

Embora todo mundo conheça uma mulher potente, a presença de mulheres acima dos 40 anos nos espaços ainda incomoda muita gente. Em março de 2023, em pleno século XXI, três estudantes de biomedicina gravaram um vídeo em uma rede social debochando de uma caloura do mesmo curso que estava às vésperas de completar 45 anos. Esse é só mais um caso de etarismo entre os tantos outros que homens e mulheres sofrem todos os dias.

Patrícia Linhares, a vítima do etarismo, contou ao G1 que “chorou bastante ao assistir ao vídeo”. Os alunos da universidade Unisagrado homenagearam a colega e a presentearam com flores, bombons e cartas de incentivo. Por sua vez, a universidade diz que tomará medidas administrativas. 

É importante ressaltar ainda que a expectativa de vida da população brasileira vem aumentando ano após ano, a última pesquisa do IBGE mostrou que as mulheres estão vivendo até os 80 anos. Outro dado que é importante ressaltar é que o último censo do ensino superior mostrou um aumento de 45% dos alunos acima de 50 anos, entre os anos de 2019 e 2021. 

Dessa forma, é urgente que as instituições preparem os seus alunos para acolher a singularidade de todas as pessoas, independentemente de raça, credo, gênero e idade. Para evitar não apenas preconceito de etarismo, mas também outras microviolências.

Afinal, o que é etarismo? É crime?

O etarismo é a discriminação ou preconceito baseado na idade. Isso ocorre quando uma pessoa é tratada de maneira injusta ou discriminatória devido a sua idade, geralmente sendo mais velha ou mais jovem do que o que é considerado “normal” para uma determinada situação. 

Embora o caso de Patrícia tenha acontecido na universidade. Infelizmente, o local que as pessoas mais costumam sofrer este tipo de preconceito é o mercado de trabalho. Há uma crença limitante que pessoas maduras são inflexíveis, não gostam de correr riscou e não tem capacidade de aprender coisas novas. Não preciso nem dizer que não apenas não concordo com isso como também afirmo que esse tipo de pensamento é característica de pessoas com mindset fixo, portanto, contrário a inovação. 

Afinal, o mindset de crescimento é fundamental para a inovação. E para inovar é preciso ter diversidade de culturas, ideias e vivências.

Além disso, é importante ressaltar que etarismo é considerado uma forma de discriminação. Inclusive, o Estatuto da Pessoa Idosa, considera o etarismo crime e a pessoa que pratica esse preconceito pode ser penalizada. Contudo, o caso que ocorreu com Patrícia não é crime, pois a pessoa é considerada idosa no Brasil após os 60 anos. Quem afirmou foi a Carla Rahal Benedetti, doutora em Direito Penal pela PUC/SP, em entrevista para o Jornal Valor Econômico. Para ela, as estudantes podem responder pelos crimes de difamação e injúria.

Como o etarismo se apresenta no mercado de trabalho?

Já no mercado de trabalho, o etarismo impede que a pessoa consiga um emprego por conta da sua idade, além de promoções e oportunidades de treinamento. As pessoas também deixam de ser convidadas para participar de grupos de inovação, eventos e novos projetos, justamente porque quem tem esse tipo de preconceito, acredita que as pessoas depois de uma certa idade não conseguem aprender coisas novas.

Para quem não conhece minha história profissional, gostaria de contar que me reinventei várias vezes. Que triste seria receber um mapa ao nascer e não puder mudar de rota durante essa trajetória de vida. Quando eu tinha cerca de 50 anos, minha vida virou de cabeça para baixo. Saí de um casamento de 22 anos, minha empresa quebrou e tive que me reinventar. 

Precisava mudar radicalmente. Afinal, estava perdendo dois nomes ao mesmo tempo: o sobrenome do meu ex-marido e o nome da minha empresa que havia falido. Decidi encarar um mestrado, encerrar a empresa, mudar de cidade, começar uma nova carreira como consultora e palestrante. Foi quando mudei de cidade. Sai de Florianópolis e me mudei para São Paulo. 

Nessa ocasião, já tinha 58 anos. Hoje tenho dois livros publicados, estou participando da elaboração de outros dois, tenho um reconhecimento no mercado nacional, ganhei prêmios e já fui citada como uma das pessoas mais criativas do Brasil, segundo a Revista Wired Festival. Mas nesse período sofri muito preconceito por conta da minha idade. Muitas vezes escutei no ecossistema de startups que eu não faria sucesso porque tinha passado da idade. Isso nunca me afetou. Minha referência de vida é a Fernanda Montenegro que aos 93 anos consegue decorar um texto e subir em um palco. 

Empresas que praticam etarismo estão perdendo talentos valiosos

Além da questão moral e discriminatória, o que é totalmente contra o empenho das empresas nas agendas de ESG, as empresas que praticam o etarismo podem estar perdendo talentos valiosos, vivências e a bagagem profissional de quem já está há algumas décadas no mercado. Já enfrentou crises econômicas e costuma ser mais resiliente do que as novas gerações.

Aliás, as principais características da geração X é o aprendizado contínuo, o que já quebra a primeira objeção de quem tem a crença limitante de que pessoas que já passaram dos 40 anos não têm capacidade de aprender coisas novas. Tudo isso sem contar que são pessoas que valorizam o trabalho em equipe e, como cresceram em um cenário de instabilidade econômica e do avanço tecnológico, costumam ser bastante adaptáveis.

No artigo Gerações no mercado de trabalho: quais os gargalos e como se potencializam já abordei esse assunto e você pode conferir algumas dicas de como potencializar equipes com diversidade etária.

Como evitar situações de discriminação por etarismo nas empresas?

  • Estabeleça uma política antidiscriminação: é importante que a empresa inclua na política de diversidade, equidade e inclusão questões referentes a discriminação por idade e o que deve ser feito quando ocorrer situações de etarismo no ambiente corporativo.
  • Sensibilização dos funcionários: crie treinamentos constantes para promover a diversidade e inclusão na empresa e certifique-se de incluir também trilhas de conhecimento voltadas para a prevenção do etarismo.
  • Foco nas habilidades: em vez de se concentrar na idade dos funcionários, as empresas podem avaliá-los com base em suas habilidades e desempenho.
  • Diversidade na contratação: a empresa pode adotar práticas de contratação que valorizem a diversidade, incluindo a idade.
  • Promova a diversidade em cargos de liderança: é importante promover a diversidade em cargos de liderança para que todos os funcionários se sintam valorizados e representados.
  • Evite estereótipos de idade: a empresa pode evitar estereótipos de idade em sua publicidade, marketing e comunicação para não reforçar a discriminação.
  • Encoraje um ambiente de trabalho inclusivo: as empresas devem criar um ambiente de trabalho inclusivo, onde todos os funcionários se sintam valorizados e respeitados, independentemente da idade.

Por fim, lembre-se que etarismo é crime e pode levar a empresa a sofrer consequências legais. Portanto, é fundamental que haja treinamento constante para que as quatro gerações possam trabalhar juntas e em sintonia. Uma aprendendo com a outra. 

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